O que é ser um fiador?
A fiança é um tipo de contrato em que uma pessoa garante o pagamento de alguma obrigação pela outra.
Neste tipo de contrato, normalmente, estão presentes três pessoas:
O devedor: É a pessoa que deve fazer o pagamento ao credor. O nome que se dá ao devedor é afiançado.
O credor: É a pessoa que tem o direito de receber o pagamento do devedor. É quem vai se beneficiar do contrato de fiança, por isso é chamado de beneficiário da fiança.
– O fiador: É a pessoa que garante o pagamento ao credor, caso o devedor não pague a obrigação que assumiu.
A fiança está prevista nos artigos 818 a 839 do Código Civil:
Art. 818. Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra.
O contrato de fiança objetiva garantir mais segurança nos contratos em geral, diminuindo o risco do credor não receber o seu pagamento, caso o devedor não faça cumpra a obrigação que assumiu.
Como é feita a fiança?
A lei exige que o contrato de fiança seja feito por escrito.
Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva.
Isto significa que não é possível que alguém se torne fiador de outra pessoa através de um contrato verbal (também chamado de contrato de boca ou no “fio-do-bigode”).
Desta forma, a fiança pode estar presente como uma cláusula dentro de um contrato ou em um contrato em separado. Nas duas hipóteses, para que tenha validade, é necessário que o fiador tenha concordado, assinando o documento.
O credor é obrigado a aceitar o fiador que o devedor indicar?
Não, o credor poderá negar o fiador indicado pelo devedor se este fiador não for pessoa idônea ou não possuir bens suficientes para garantir a dívida.
Art. 825. Quando alguém houver de oferecer fiador, o credor não pode ser obrigado a aceitá-lo se não for pessoa idônea, domiciliada no município onde tenha de prestar a fiança, e não possua bens suficientes para cumprir a obrigação.
O fiador pode ser cobrado na justiça?
Sim, o fiador pode ser cobrado na justiça, porém, em regra, primeiro o credor deve tentar receber o valor devido do devedor (afiançado), para só tentar receber do fiador.
Art. 827. O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor.
O nome que se dá a essa exigência do credor ter que tentar primeiro receber o seu crédito do devedor, para só depois tentar receber do fiador é chamado benefício de ordem.
Para que o fiador possa usufruir do benefício de ordem, é necessário que indique bens do devedor que podem garantir a dívida com o credor.
Art. 827. O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor.
Parágrafo único. O fiador que alegar o benefício de ordem, a que se refere este artigo, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito.
A lei possibilita afastar a regra do benefício de ordem, permitindo que o fiador renuncie a este benefício. Quando isto ocorre, o credor pode cobrar o fiador diretamente, antes ou juntamente do devedor. Para que a renúncia do benefício de ordem seja possível é necessário que haja previsão contratual neste sentido e que o fiador tenha concordado, através de sua assinatura no contrato.
Art. 828. Não aproveita este benefício ao fiador:
I – se ele o renunciou expressamente;
II – se se obrigou como principal pagador, ou devedor solidário;
III – se o devedor for insolvente, ou falido.
Na prática, na grande maioria dos contratos em que se exige um fiador já há cláusula de renúncia ao benefício de ordem, justamente porque dá mais segurança ao credor, caso seja necessário propor alguma ação para receber o seu crédito.
A fiança pode sofrer alguma limitação?
Sim, a fiança pode sofrer algumas limitações. Veremos algumas a seguir.
1 – A fiador não poderá ser responsabilizado por alguma obrigação que não assumiu ou não está prevista no contrato (art. 819, Código Civil).
Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva*.
*Não permitir interpretação extensiva significa que a responsabilidade do fiador se limita somente ao que está previsto no contrato, não podendo interpretar extensivamente, ou seja, além daquilo que está escrito.
2 – O fiador nunca poderá ser responsabilizado por um valor maior do que o devido pelo devedor. Se o contrato prever a fiança em valor maior, ela se limitará ao valor devido pelo devedor (art. 823, Código Civil).
Art. 823. A fiança pode ser de valor inferior ao da obrigação principal e contraída em condições menos onerosas, e, quando exceder o valor da dívida, ou for mais onerosa que ela, não valerá senão até ao limite da obrigação afiançada.
3 – É possível ser fiador de somente parte da dívida do devedor. (art. 823, Código Civil). Esta limitação também deve constar no contrato.
Art. 823. A fiança pode ser de valor inferior ao da obrigação principal e contraída em condições menos onerosas, e, quando exceder o valor da dívida, ou for mais onerosa que ela, não valerá senão até ao limite da obrigação afiançada.
4 – É possível haver mais de um fiador da mesma dívida e inclusive limitar contratualmente a obrigação de pagamento de cada fiador.
Nos casos em que há mais de um fiador, é necessário estar atento para detalhar no contrato especificamente sobre quanto da dívida cada fiador está assumindo a responsabilidade.
Se o contrato não prever uma limitação, todos serão responsáveis pela dívida toda (art. 829, Código Civil).
Art. 829. A fiança conjuntamente prestada a um só débito por mais de uma pessoa importa o compromisso de solidariedade entre elas, se declaradamente não se reservarem o benefício de divisão.
Parágrafo único. Estipulado este benefício, cada fiador responde unicamente pela parte que, em proporção, lhe couber no pagamento.
Havendo previsão contratual definindo especificamente a parte da dívida que cada fiador assumiu, esta previsão contratual deverá ser respeitada (art. 829, parágrafo único e art. 830 do Código Civil).
Art. 829. A fiança conjuntamente prestada a um só débito por mais de uma pessoa importa o compromisso de solidariedade entre elas, se declaradamente não se reservarem o benefício de divisão.
Parágrafo único. Estipulado este benefício, cada fiador responde unicamente pela parte que, em proporção, lhe couber no pagamento.
Art. 830. Cada fiador pode fixar no contrato a parte da dívida que toma sob sua responsabilidade, caso em que não será por mais obrigado.
Caso um dos fiadores pague a dívida do devedor por completo, terá direito de exigir o pagamento dos outros fiadores, na proporção da cota assumida por cada um.
Art. 831. O fiador que pagar integralmente a dívida fica sub-rogado* nos direitos do credor; mas só poderá demandar a cada um dos outros fiadores pela respectiva quota.
*Sub-rogar significa substituir. Ou seja, o fiador que paga a dívida, assume a posição de credor dos outros fiadores, podendo deles exigir o ressarcimento.
O que acontece se o fiador pagar a dívida do devedor?
O fiador que paga a dívida toda do devedor principal assume a posição do credor do devedor, podendo exigir do devedor o ressarcimento (art. 831 e 346 do Código Civil).
Art. 831. O fiador que pagar integralmente a dívida fica sub-rogado nos direitos do credor; mas só poderá demandar a cada um dos outros fiadores pela respectiva quota.
Art. 346. A sub-rogação opera-se, de pleno direito, em favor:
III – do terceiro interessado*, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em parte.
*Terceiro interessado é uma pessoa que pode vir a ser obrigada a responder com seus bens pela dívida do devedor, caso o devedor não cumpra a obrigação. É exatamente o caso do fiador.
Há alguma situação em que fiador não é mais responsável pela obrigação assumida?
Sim, algumas.
1 – Se houver o pagamento da dívida pelo devedor.
2 – Se por alguma razão, a dívida do devedor deixar de existir. Como por exemplo o perdão da dívida.
3 – Se houver previsão contratual estabelecendo um limite máximo de tempo em que o fiador se responsabiliza pela dívida e este tempo já se ultrapassou.
4 – Se o contrato não prever tempo máximo para a fiança acabar, o fiador poderá pedir exoneração da obrigação quando quiser. Neste caso o fiador deverá enviar uma notificação ao credor e continuará responsável pelas obrigações que assumiu no contrato de fiança por até 60 (sessenta) dias.
Art. 835. O fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante sessenta dias após a notificação do credor.
5 – Se o credor permitir que o devedor pague a dívida em data posterior da que foi combinada, sem que o fiador tenha concordado.
Art. 838. O fiador, ainda que solidário, ficará desobrigado:
- I – se, sem consentimento seu, o credor conceder moratória ao devedor;
A ideia aqui é de que o fiador só se responsabilizou pelo que está previsto no contrato, nos exatos termos do que foi combinado.
6 – Se o credor praticar algum ato que impossibilite o fiador de sub rogar nos seus direitos.
Art. 838. O fiador, ainda que solidário, ficará desobrigado:
II – se, por fato do credor, for impossível a sub-rogação nos seus direitos e preferências;
Por exemplo: Em um empréstimo bancário, o devedor ofereceu um veículo como garantia e o banco também exigiu um fiador.
Por alguma razão o credor (banco) permite o devedor liberar o carro dado em garantia. Nesta situação o fiador ficará prejudicado, pois se o fiador pagar a dívida do devedor, assumirá a posição de credor, mas o devedor não terá mais o veículo para lhe ressarcir do que foi pago. Nesta situação o fiador estará exonerado da obrigação.
7 – Se o credor aceitar amigavelmente como pagamento pelo devedor coisa diferente daquilo que foi estipulado no contrato.
Art. 838. O fiador, ainda que solidário, ficará desobrigado:
III – se o credor, em pagamento da dívida, aceitar amigavelmente do devedor objeto diverso do que este era obrigado a lhe dar, ainda que depois venha a perdê-lo por evicção.
Por exemplo, o devedor deveria pagar ao credor uma quantia em dinheiro, mas o credor aceita receber como pagamento um veículo. Nesta hipótese o fiador não será mais responsável pela dívida, exatamente porque fugiu daquilo que previa o contrato.
O que acontece se o fiador morrer?
O fiador só tem responsabilidade pelas dívidas existentes até a data do seu falecimento e até o limite dos bens que deixou aos seus herdeiros.
Art. 836. A obrigação do fiador passa aos herdeiros; mas a responsabilidade da fiança se limita ao tempo decorrido até a morte do fiador, e não pode ultrapassar as forças da herança.
Isto significa que, se o atraso do pagamento pelo devedor for posterior ao falecimento do fiador, os bens deixados pelo fiador não responderão pela dívida.
Se o atraso já existia a época do falecimento do fiador, os bens do fiador responderão pela dívida. Vale frisar que os bens dos herdeiros não serão atingidos, mas tão somente os bens deixados pelo fiador.
E se o fiador for casado?
Caso o fiador seja casado, é necessário que haja autorização do seu cônjuge, salvo se forem casado no regime de separação de bens.
Esta é uma exigência legal, prevista no art. 1.647 do Código Civil:
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
III – prestar fiança ou aval;
Neste caso o cônjuge poderá ser mero concordante de que seu companheiro seja fiador ou poderá ser fiador em conjunto.
Caso seja mero concordante da fiança, havendo inadimplemento, sua parte dos bens não poderá ser atingida. Se for fiador em conjunto, também responderá com seus bens pelo pagamento da dívida.
Conclusão:
Como pode se perceber, o contrato de fiança não traz qualquer benefício ao fiador, mas tão somente ao credor.
Ainda que o fiador possa cobrar a dívida do devedor a dívida que pagou, não é garantido que haverá o recebimento.
Então é recomendável que, caso alguém peça que você seja fiador de algum contrato, que seja uma pessoa de sua confiança, pois assumir a responsabilidade de ser fiador implica necessariamente em expor a risco o seu patrimônio.
Espero ter ajudado!
Murilo Moreno Gregio – OAB/PR 61.589